quinta-feira, 7 de julho de 2016

Juiza condena Facebook a restabelecer página de blog


A Excelentíssima Juíza do Juizado Especial Cível da Comarca de Canoas-RS, homologou sentença condenando o Facebook a restabelecer uma página de uma empresa proprietária de um blog de humor existente na rede que foi retirada do ar.

A empresa D.O.F.I. - ME é proprietária do blog de humor Não Intendo e ajuizou uma ação de obrigação de fazer contra o Facebook Serviços Online do Brasil LTDA, alegando que já algum tempo vem sofrendo aplicação de penalidades consistentes em bloqueios, que a impediam de realizar postagens de conteúdos diversos.

A empresa entende que os bloqueios são ilegais, pois são aplicados sem qualquer aviso ou possibilidade de defesa, o que induz a violação do contraditório e da ampla defesa previstos na Constituição Federal. Argumenta ainda que a conduta do Facebook é abusiva já que viola normas do Consumidor, e do próprio Marco Civil da Internet. Alega também que as penalidades acabam por refletir de forma direta nos rendimentos da empresa, já que parte considerável dos usuários captados pelo blog, provém da página da rede social e que o bloqueio acaba reduzindo dramaticamente os acesso de visitantes, e por consequência, reduzindo também o valor espaços publicitários alocados no blog, gerando graves prejuízos de ordem material a empresa.

Assim, requereu o desbloqueio de sua página, bem como que a rede se abstivesse de proceder qualquer outro novo bloqueio ou aplicação de qualquer outra penalidade que possa limitar as publicações na página, sob pena de multa diária, sem que lhe seja dada a oportunidade de recorrer  anteriormente, com prazo razoável para resposta.

Houve também, um pedido de tutela de urgência consistente na suspensão do bloqueio realizado, que inicialmente foi indeferido pela juíza do caso, que determinou que aguardasse a resposta do Facebook, para apreciação posterior.

Citada, a rede social apresentou sua contestação alegando, em preliminar: a ilegitimidade da filial sediada no Brasil; e também a falta de interesse de agir da autora dado que há época em que fora citada, a rede já teria desbloqueado a página da autora. No mérito alegou que agiu em exercício regular de direito, pois a empresa autora teria violado os Termos de Uso e as Politicas de Privacidade da Rede, cuja adesão decorre de ato jurídico perfeito celebrado entre as partes quando da contratação de seus serviços; pleiteando ao final pela improcedência da ação.

A empresa autora apresentou réplica a contestação, reforçando a legitimidade da filial para responder a ação já que a rede explora a atividade no país, e portanto sujeita-se as normas do CDC. Replicou também a tese de interesse de agir, já que haviam outros pedidos ainda não apreciados entre outros pormenores. No mérito, impugnou as teses de exercício regular de direito e de ato jurídico perfeito, em especial destaque porque trata-se de contrato de adesão, e também porque os ditos Termos de Uso e Políticas de Privacidade são baseadas em normas Norte Americanas, das quais o Brasil sequer é signatário, e portanto, inaplicáveis no país.

Tanto na audiência de conciliação, quanto na audiência de instrução, não houve qualquer proposta de acordo por parte da rede social.

Inobstante o desbloqueio das postagens, no curso do processo a rede simplesmente resolveu tirar a página do ar; o que motivou a autora a apresentar novo pedido de tutela de urgência incidental, que foi deferido pela juíza do caso, nos seguintes termos: "Com o que, presentes os requisitos do art. 300 do CPC/2015, porquanto demonstrado que a utilização da página do facebook integra o labor do autor, DEFIRO o pedido de antecipação de tutela para que a demandada, no prazo de 48 horas, proceda ao desbloqueio da página do autor, disponibilizada no seguinte link: <https://www.facebook.com/Naointendo> sob pena de aplicação de multa diária, que fixo em R$300,00, nos termos do art. 537 do CPC/2015."

Superada a instrução, sobreveio a sentença que reconheceu a legitimidade da empresa para responder a lide, fundamentando a decisão inclusive com base em um julgado do STJ (REsp nº 279.273/SP). Conforme entendimento do juízo "No caso dos autos, apesar do serviço oferecido pelo Facebook ser de empresa estrangeira sem sede no Brasil, tal serviço é ofertado ao público brasileiro, que, sabidamente, tem milhares de usuários. Por outro lado, a própria ré admite que pertence ao mesmo grupo econômico do Facebook em fls. 126/127, o que reforça a aplicação dos dispositivos consumeristas ao caso concreto." - E acrescenta: "Desta forma, o ajuizamento da presente ação em face da ré está justificada e amparada no artigo 28, § 5º, do CDC, porquanto, a ausência de sede do FACEBOOK, INC. E FACEBOOK IRELAND LTD. no Brasil – empresas estrangeiras com sede no Estados Unidos da América e na Irlanda respectivamente – é, sem dúvida alguma, obstáculo ao seu ressarcimento como consumidora do serviço por ela ofertado. Veja-se que completamente desarrazoado seria exigir que a autora ajuizasse a ação no foro de seu domicílio, postulando a citação e intimação da ré por meio de carta rogatória, o que, inevitavelmente, teria mais de seis meses de tramitação quando, então, legalmente, o que levaria um prejuízo enorme à autora, já que a possível solução do feito poderia levar a um prejuízo incalculável à autora, sem falar no custo de tudo isso para partes e poder judiciário. Admitir essa hipótese seria o mesmo que negar à autora seu direito de proteção como consumidora."

Igualmente a decisão afastou a tese de falta de interesse de agir assinalando que "Já em relação a preliminar de falta de interesse de agir, esta se confunde com o próprio mérito da ação. Ademais, conforme última manifestação da autora, a página 211/216, a página ainda estaria fora do ar, o que denota o interesse de agir da autora em buscar seus direitos como consumidora."

No mérito, de início a sentença reconheceu a aplicabilidade do Código do Consumidor na relação estabelecida entre as partes com base nos art. 2º e 3º do Código, estabelecendo contudo a necessidade de comprovação dos direitos alegados por ambas as partes.

Reconheceu que a empresa autora comprovou a ocorrência das penalidades que vem sofrendo, e que o Facebook, por seu turno, não comprovou a ocorrência de qualquer fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito da autora, sequer demonstrando qual postagem teria sido a causa da retirada da página do ar, se não confira-se do trecho da sentença: "A parte requerida, por sua vez, apesar de comprovar o seu direito em averiguar denúncias contra a autora por realizar postagens em desacordo com os princípios do Facebook, não comprovou fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito do autor, pois não demonstrou a origem da postagem que causou a retirada da página da autora do ar, conforme lhe incumbia, a teor do disposto no art. 373, II do CPC. Cabia à requerida comprovar a efetiva regularidade de seu direito. Poderia tê-lo feito, por exemplo, trazendo aos autos a(as)  postagem(ns) que supostamente estaria(am) em desacordo com a política do Facebook, o que não fez. Assim, por ausente comprovação da irregularidade da(s) postagem(ns), foi indevida a retirada da página da autora do ar."

Ao final, a sentença julgou pela parcial procedência da ação, "tão somente, tornar definitiva a antecipação de tutela concedida em fls. 207, relativamente ao bloqueio objeto da demanda." reconhecendo-se assim o direito da autora ao restabelecimento da página, sob pena de multa diária. Vale destacar que a multa ainda é passível de majoração, caso a decisão não venha a ser cumprida pela rede social em questão.

A empresa autora ainda avalia se vai recorrer da decisão, bem como a possibilidade de ajuizamento de ações indenizatórias devido aos prejuízos e perdas sofridas com os bloqueios e retiradas da página do ar.

O Facebook, ainda não foi intimado da decisão.

Fontes:
I - Site Migalhas
II - Site do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul - Processo nº.: 9001578-97.2016.8.21.0008